quarta-feira, 25 de abril de 2012

Um certo vento

Sopra um vento
com muitas partículas
espalhando e levando
em forma de pó
as nossas possibilidades.
São miragens no horizonte que nos enganam.
São falsos brilhos
dos nossos metais sem valor, 
a nossa incapacidade de julgar
o nosso fracasso
embebido por toda essa ociosidade,
a nossa obesidade de cortesias
como um tumor
que nos devora o futuro.
E nos destruímos sorridentes e silenciosos
banhados, arrumados e perfumados
como cadáveres lindos
aterrorizados
com a besta que nos ronda
a fera da nossa verdade
espreitando
como um fantasma
da vida que nunca teremos.


Sopra esse vento
posso senti-lo nos ossos
como um leve murmúrio
que acalma e desnorteia
deslocando nossas dunas
de culpas que negamos
os crimes que cometemos
as desculpas que criamos
pra que tudo ainda tenha um sentido
contra o demônio em nós
que nos tira
segundo a segundo
a infância e a velhice
a chance e a promessa.
Estamos unidos
com essa gente estranha
aliados por uma causa torpe e fútil
numa ânsia de apenas continuar
já que nunca aprendemos a parar.
Deserdados da alegria
nos consumimos em prazer
Fragmentados ao vento
somos áridos de perguntas
e soterrados de respostas.


Mal posso respirar
esse vento
esse ar de chumbo e corpos
essa brisa suave
que me abrasa e corrói
esculpindo em mim
uma forma que me agride
erodindo
pouco-a-pouco
o calcário que me sustenta.
E o que vejo
não faz sentido
e assim menos razões invento
esqueço, não lembro
eia nossa grande missão
não ser mais nada
do que essa figuras grotescas
marteladas pela ignorância
cinzeladas pela mão do acaso
deformados pelo conforto
desenhados com cuspe e sangue
de todos os tolos do passado
dos vultos inertes do futuro
matizados de solidão e lamento
escravizados por trabalhos furtivos
correndo do medo
do medo de nos alcançarmos
e finalmente nos vermos
cara-a-cara
de dobrar uma esquina
e não sentir mais nada
de dormir e acordar igual
do vento lento
tomar conta de tudo
e nós com tal desconforto
içar velas
e invadir o nosso mundo
que sempre esteve logo ali.


O vento da negação
e dos erros tolos
que não reparamos
aquilo dentro de nós
que nos observa e oprime
como um reflexo perplexo
como se tornássemos miragens
do que esquecemos de perseguir.
E eu corro
até os outros
e tento ouvi-los
como forma de calar em mim
as vozes que me gelam,
salvo o que vive
fora de mim
porque já não tenho corpo
sou um esterco infértil
que não gera vida
uma massa opulenta
trasbordada de pena e conformismo
um caldo ácido e borbulhante
primitivo, aflitivo e infinito.







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